sexta-feira, 3 de junho de 2011

AVC: uma doença que ninguém conhece

Pesquisa de percepção pública do AVC, doença que mais mata no país, mostra que o brasileiro não consegue reconhecer e reagir aos sintomas de alguém com a doença.
O brasileiro entende de saúde? Consegue reconhecer os sintomas de doenças com alto grau de mortalidade? Sabe o número que deve ser discado em caso de emergência médica? Uma pesquisa de percepção pública sobre o acidente vascular cerebral (AVC), a doença que mais mata no país, mostrou que a resposta para essas perguntas é não.
Pesquisadores do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto chegaram a essa conclusão depois de entrevistar 801 pessoas de quatro grandes cidades brasileiras: São Paulo, Salvador, Fortaleza e Ribeirão Preto. Aos entrevistados era descrito a cena de um idoso com sintomas claros de AVC. Em seguida, fazia-se uma série de perguntas sobre fatores de risco preponderantes, reconhecimento dos sintomas e reação do entrevistado diante daquela suposta situação de emergência.
Para 22% dos pesquisados, sintomas como dificuldade súbita para falar, andar ou enxergar e fraqueza ou dormência em um lado do corpo não eram considerados sinais de AVC, mas sim de infarto do miocárdio, epilepsia ou câncer. Dentre os que identificaram corretamente a situação, 28 denominações diferentes foram dadas à doença. As mais comuns foram derrame, trombose, infarto cerebral e passamento.

O pior, entretanto, não diz respeito à nomenclatura ou reconhecimento dos sintomas de uma artéria cerebral entupida, mas às medidas tomadas pelos entrevistados após este reconhecimento. É que o AVC pede extrema velocidade na chegada do paciente à emergência de um hospital capacitado para atendê-lo. O paciente que chega depois de passadas três horas do surgimento dos sintomas iniciais aumenta muito o risco de morte ou seqüelas permanentes.
Ao perceber que alguém teve um AVC, mais da metade dos entrevistados (51%) tomaria a atitude correta que é ligar para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). Tudo bem até aí, se não houvesse um porém. É que, ao se questionar qual o número de atendimento do Samu, 65% não souberam responder ou citaram números diferentes de 192 ou 193 (varia conforme o Estado). Houve inclusive quem citasse 911 (2% da amostra), número utilizado para emergências nos EUA e outros países.

Zona de penumbra e novos tratamentos
Até 10 anos atrás era comum ver um paciente com AVC largado em algum canto do hospital. Os médicos diziam que não se tinha o que fazer, pois não havia tratamento para essas pessoas. No máximo se prescrevia algumas sessões de fisioterapia para tentar melhorar as limitações físicas impostas pelas seqüelas.
Hoje o cenário mudou drasticamente. De 2000 para cá, muitos pacientes brasileiros com AVC já podem contar com o trombolítico Alteplase (TPA), uma substância aplicada na artéria ou veia do paciente que restabelece o fluxo sangüíneo para a região cerebral afetada.
“Nos casos em que ocorre a desobstrução da artéria com trombolítico, em menos de três horas, parte da região afetada pode voltar a funcionar e os sintomas tendem a regredir ou desaparecer. Essa região recuperada é freqüentemente denominada zona de penumbra”, diz Octávio Pontes Neto, coordenador da pesquisa da USP.
Estudos mostram que o TPA diminui em 30% o número de pacientes incapazes ou com seqüelas. Infelizmente, o uso medicamento possui um risco de hemorragia intracraniana que varia entre 3 e 6%. Isso faz com que apenas 5% dos atuais pacientes se encaixem nos rigorosos critérios de seleção.
“O principal problema de não conseguirmos aumentar o número de pacientes trombolisados no Brasil é a lógica de atendimento do SUS e falta de equipes de AVC nas emergências dos hospitais”, disse Viviane Flumignano, coordenadora do Serviço de Doenças Cerebrovasculares do HC da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Segundo ela, um paciente com AVC não pode passar por um posto de saúde primeiro, como é a prática no sistema de saúde público, para depois ser levado a um hospital referência. “Perde-se muito tempo nisso e quando o paciente chega não há mais nada que possamos fazer”, lamenta.
O segredo consiste em uma ação conjunta, dizem os neurologistas da USP de Ribeirão. Quem percebe uma pessoa com AVC deve comunicar imediatamente o Samu. Os paramédicos precisam estar treinados para levar o paciente no menor tempo possível a um hospital com um neurologista de plantão 24h. Só assim teremos condições de aumentar o número de pacientes trombolisados e, quem sabe, diminuir a quantidade de mortos por essa doença.

Wii-terapia e ondas magnéticas no tratamento de pacientes com AVC

O acidente vascular cerebral (AVC), o popular derrame, é a doença que mais causa mortes e incapacidade física no Brasil. O derrame cerebral pode ser de dois tipos: o isquêmico, que é a falta de circulação numa área do cérebro devido à obstrução de uma ou mais artérias por placas de gordura, e que acomete pessoas mais velhas, com diabetes, colesterol elevado, hipertensão, problemas vasculares e fumantes; e o hemorrágico, um sangramento cerebral provocado pelo rompimento de uma artéria ou vaso sanguíneo, em função de hipertensão arterial, problemas na coagulação e traumatismos.

Os sinais de AVC são: fraqueza ou amortecimento súbito de um lado do corpo; dificuldade súbita para falar, enxergar, compreender, andar ou equilibrar-se; tontura ou dor de cabeça súbita, sem causa aparente.

O neurologista da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp Li Li Min ensina três manobras que permitem identificar até 75% dos casos de AVC: pedir que o paciente estique os braços, pois se estiver acometido não conseguirá sustentar um dos membros; pedir que dê um sorriso, sendo que um desvio da rima labial denotará fraqueza da musculatura facial; e pedir que repita uma frase, a fim de verificar a articulação da fala. Entretanto, ressalta o especialista, há micro acidentes vasculares cerebrais que podem acometer uma pessoa ao longo da vida levando-a a um estado conhecido por demência.

Este é um dos temas que será abordado nos dias 3 e 4 de junho nos anfiteatros do conjunto de salas de aula da FCM durante o V Encontro AVC Campinas. Outros temas programados são orientações básicas sobre prevenção e reabilitação de pacientes. Este tema é aberto para o público leigo. Dentro da programação do sábado, a fisioterapeuta Eveline Polezel, do Centro de Reabilitação de Souzas, Campinas, irá demonstrar os benefícios da Wii-terapia em pacientes com AVC. A professora Adriana Conforto, da USP de São Paulo, também falará sobre sua pesquisa “Estimulação transcraniana”. Ela utiliza ondas magnéticas para despolarizar o cérebro e ativa os neurônios.

“Ambientes virtuais parecem beneficiar na recuperação motora de pacientes com AVC. A Wii-terapia é uma linha de pesquisa que estamos desenvolvendo num projeto chamado Destine. Diferente do clássico AVC em que uma pessoa fica subitamente paralisada ou esquecida, uma grande parcela da população está com perda de memória. Quando você faz uma investigação das causas, você percebe que ela teve pequenos AVCs que se somam ao longo do tempo. Tem muita coisa que podemos fazer pelo paciente com AVC”, explicou Li Min, coordenador do V Simpósio AVC Campinas.